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2 de abr. de 2014

Ditadura Civil-Militar e Educação

Devido a correria do cotidiano de professora e estudante, perdi as datas de 31 de Março e 01 de Abril para postar algum conteúdo relacionado aos 50 anos do golpe militar no Brasil.
Entretanto, o ano é do cinquentenário e o assunto é bem presente neste blog. Postarei hoje uma reportagem do jornal Correio do Povo sobre a educação brasileira no contexto da ditadura. Para acessar diretamente no site, clique aqui.

Regime Militar deu golpe na educação do Brasil

Nos 50 anos da tomada de poder pela Ditadura, professores avaliam os prejuízos para o ensino

Nos 50 anos da tomada de poder pela Ditadura, professores avaliam os prejuízos para o ensino- Crédito: André Ávila
Nos 50 anos da tomada de poder pela Ditadura, professores avaliam os prejuízos para o ensino
Crédito: André Ávila
Na noite do dia 31 de março de 1964, o regime político vigente no Brasil sofreu um golpe. Mas o País seria golpeado muitas vezes até 1985. Para permanecer no poder, os militares prendiam, torturavam e manipulavam. A censura aos meios de comunicação limitou o acesso à informação dos brasileiros e também foi aplicada nas escolas, causando prejuízos com reflexos até hoje. 

Enquanto nos porões da ditadura, os que se opunham ao governo eram até mesmo mortos, na superfície, a tentativa era mostrar que o Brasil estaria vivendo um milagre econômico. A campanha ufanista da época encorajava a população a acreditar que vivia em um país do futuro, sem saber detalhes da repressão, ou de dados que desfavorecessem o regime. 

Certos livros considerados subversivos por qualquer motivo eram retirados do conteúdo bibliográfico dos colégios e das universidades. Os professores precisavam ficar atentos ao que falavam por medo de alunos e colegas infiltrados. O recado para se calarem era enviado através do sumiço de outros docentes. Além disso, houve reformas e inclusão de disciplinas com teor nacionalista. A mudança nos currículos na década de 1960 criou duas novas matérias: Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política do Brasil (OSPB). O objetivo era transmitir a ideologia da Segurança Nacional. 

“Aparentemente, estávamos vivendo uma normalidade, mas nós sabíamos que não era bem assim”, descreve a professora de História, Ione Osório, 76 anos. Mãe de três filhos pequenos na época do golpe, dava aula na Escola Estadual Cristóvão Mendonza Caxias do Sul e, mais tarde, no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, o Julinho, em Porto Alegre. Ela lembra que a inclusão das duas novas matérias foi motivo de discussão, porque delegados de fora do colégio foram incumbidos de ministrar as aulas. “O currículo era para dar a aparência de que o Brasil era um modelo sob a gestão daquele governo, mas a estatística não era verdadeira. Os números eram maquiados, inclusive o de reprovados”, comenta. “Eu era coordenadora da História do Julinho e lutamos para que os próprios professores da escola dessem essas aulas. Dessa forma, adaptamos o currículo”, lembra esboçando um sorriso ao recordar da forma que encontrou para driblar o governo e de transformar a emenda das duas cadeiras nacionalistas em conteúdos de História do Brasil e de Geografia, transmitidos de forma mais crítica. 

Censura em sala de aula

Na Serra, logo no início do regime, a professora lembra uma ocasião em que ensinava regimes políticos. “Passava alguns exemplos do que acontecia no mundo e no Brasil”, conta. Ela ressalta que mencionava o que ocorria no país, mas não colocava o conteúdo da aula no papel por temer ser chamada pelos militares para dar explicação. “Sabíamos que muitos professores e alunos eram ligados ao regime e havia infiltrados”, diz. Essa era outra maneira de contornar a censura. Porém, um estagiário distribuiu à classe um programa não oficial. “Eu havia orientado que não colocasse no papel, mas acho que ele quis se expressar. A cópia em mimeógrafo foi parar no Comando do Exército e, depois disso, ele sumiu. Não concluiu o curso de História na universidade”, descreve sem conseguir controlar as lágrimas, enquanto lembrava também da detenção de cinco alunos.

Atualmente Ione é presidente da Fundação de Apoio ao Colégio Estadual Julio de Castilhos e voltou a uma das classes onde ministrava História para contar sobre os anos de chumbo. “Aqui no Julinho, a resistência era mais aberta, mas também havia na escola delegados do Departamento de Ordem Política e Social (Dops). O Grêmio Estudantil foi extinto”, diz. 

Memória da Ditadura ainda é recuperada

Segundo a professora, em razão da tentativa de controlar a informação, a memória sobre aqueles anos, só foi recuperada depois. “Nem nós que tínhamos interesse, sabíamos de tudo que ocorria”, declara, afirmando que a maioria da população só passou a tomar pé da situação, na década de 1980, após a abertura. “Até hoje, muitas coisas não foram elucidadas e ainda estamos descobrindo. A história nunca termina”, observa. “Acho importante tudo o que leva à verdade, mesmo que seja tarde.”

Regimes autoritários exaltam o nacionalismo

A professora de pós-graduação da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs), Maria Helena Bastos, assegura que todo regime autoritário costuma exaltar o nacionalismo e criar o sentimento de nação. Para ela, algumas mudanças no currículo foram responsáveis pela implementação de métodos que não estimulavam o pensamento crítico. “Formamos jovens para marcar cruzinhas”, descreve, avaliando que esse tipo de ensino não mudou muito efetivamente de lá para cá. 

Lembra ainda que os acordos e reformas não foram exclusividade do Regime Militar. Algumas versões já haviam sido ensaiadas. “Os acordos já vinham sendo gestados antes”, diz. 

Maria Helena observa que indiscutivelmente o controle à informação representou uma lacuna e atrasou o ensino. Eram diferentes formas de repressão, incluindo a proibição de livros, programas de TV e filmes. “Lembro de ler livros encapados”, diz. Porém, pondera que a censura sempre fez parte da história do Brasil desde o Império. “Portugal filtrava tudo o que vinha para cá”, afirma.

Contudo, observa que os malefícios do período militar ao ensino são relativos, já que houve alterações positivas no ensino universitário e de pós-graduação através de alguns acordos, por exemplo. Ela também lembra que houve expansão entre 1973 e 1985 da matrícula nas escolas em torno de 40%, apesar de essa ampliação do acesso não vir acompanhada de qualificação. “A memória tem sempre dois lados.”

Queda da qualidade do ensino público

Para o autor do livro Golpe na Educação, professor Luiz Antonio Cunha, as políticas educacionais durante o governo militar tinham o objetivo de cristalizar uma ideia de que a sociedade estaria em processo de degeneração. “A concepção da educação pública como elemento de regeneração da sociedade é herdada tanto do cristianismo, quanto do positivismo”, analisa. Por isso, foi reforçado o ensino religioso e, implementadas disciplinas com cunho nacionalista.

Outra vertente, explica o sociólogo, doutor em Filosofia e mestre em Planejamento Educacional, Luiz Antonio Constant Rodrigues da Cunha, foi a concepção de que o ensino seria um instrumento de acumulação de capital. “Se plantou essa ideia naquela época. Isso cresceu e deu muitos frutos colhidos até hoje”, ressalta. As consequências, segundo ele, foram subsídios para o fortalecimento do setor privado em todos os níveis. “Secretarias de educação foram assumidas por empresários em muitos estados, que fizeram com que a qualidade caísse nas escolas públicas”, observa. No período, também houve queda nos salários do Magistério. “Isso forçou uma demanda de educação privada”, afirma.

Em Minas Gerais, por exemplo, a lei determinava que para se abrir uma escola pública era preciso que o sindicato dos professores de escolas particulares estivesse de acordo. “A duras penas, o governo Tancredo Neves conseguiu mudar e legislação em 1983”, salienta.

O resultado foi o aumento da desigualdade. “É das mais fortes que já vi no mundo”, conta. “Até o Golpe, em todos os estados, as escolas públicas eram as melhores. Podia ter escola privada tão boa, mas não melhor do que as públicas. Depois a situação mudou”, declara, dizendo também que os quadros escolares nunca mais voltaram a ter o mesmo padrão. “Hoje a escola pública se transformou em escola para pobre e de má qualidade, com exceção de instituições federais e escolas técnicas”, diz.

Por outro lado, Cunha menciona, assim como a professora Maria Helena, que o ensino superior cresceu bastante na Ditadura. “Se criou um Frankenstein educacional: ensino público superior de alta qualidade e ensino fundamental e médio de baixa qualidade. Incongruente”, avalia.

13 de mar. de 2014

Sobre Educação

Gostei muito desse trecho final do texto "A Crise do Giz", de Thomaz Wood Jr.

"Ensinar e aprender trata-se de um processo relacional que vai além dos métodos e das tecnologias. Diz essencialmente respeito a relações humanas. Não é entretenimento ou diversão. Tampouco é sofrimento. Envolve escutar, avaliar, refletir e praticar. Pode ser penoso, às vezes, mas deve sempre recompensar estudantes e professores. Pode usar novos métodos e novas tecnologias, mas depende essencialmente da construção de um palco para a interação coletiva".


10 de mar. de 2014

Doze Anos de Escravidão


Retirando a poeira deste blog, eis o ganhador do Oscar de melhor filme em 2014. Doze Anos de Escravidão. Filme elaborado a partir do livro escrito por Solomon Northuop, liberto que foi sequestrado e tornado escravo por doze anos. O filme se passa nos EUA do século XIX, mas segundo Lilia Moritz Schwarcz e Maria Helena Machado, o regime escravista de lá retratado no filme tem semelhanças com o sistema escravista do Brasil. 

As historiadoras escreveram um texto comentando o filme e as possíveis comparações entre a escravidão dos EUA e a do Brasil. Segue o link para o texto: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrissima/154391-um-pouquinho-de-brasil.shtml

8 de mar. de 2014

Dia Internacional da Mulher

Para lembrar esse dia de luta por igualdade de gêneros, deixo aqui o discurso de agradecimento de Lupita Nyong'o no evento "Black Women in Hollywood". O discurso foi retirado do blog Escreva Lola Escreva
Para quem não sabe, Lupita é atriz e ganhou o Oscar como Atriz Coadjuvante no filme também pemiado "Doze Anos de Escravidão".

Eis o discurso da moça:

Recebi uma carta de uma garota e gostaria de dividir um pequeno trecho com vocês: “Querida Lupita,” diz ela, “Acho que você é realmente sortuda por ser tão negra e ainda assim fazer esse sucesso todo em Hollywood da noite para o dia. Eu estava quase comprando o creme Dencia’s Whitenicious para clarear a minha pele quando você apareceu no mapa mundial e me salvou”.
Meu coração sangrou um pouco quando li essas palavras. Jamais poderia imaginar que meu primeiro trabalho após terminar os estudos seria tão poderoso em e por si mesmo que me lançaria como uma imagem de esperança da mesma forma que as mulheres de A Cor Púrpura o foram para mim.
Lembro de um tempo em que eu também não me sentia bonita. Eu ligava a TV e só via peles rosadas, clarinhas. Eu achava que minha pele de matiz noturnal era uma provocação e um insulto. E minha única súplica a Deus, o fazedor de milagres, era que eu pudesse acordar com a pele mais clara. Vinha a manhã e eu ficava tão excitada para ver minha nova pele que me recusava a olhar os meus pés até estar de frente ao espelho, porque eu queria ver meu rosto claro primeiro. E todos os dias eu vivia a mesma decepção de continuar tão escura quanto no dia anterior. 
Eu tentava negociar com Deus: dizia pra ele que iria parar de roubar torrões de açúcar à noite se ele me desse o que eu queria; que ouviria todas as palavras de minha mãe e nunca mais perderia minha blusa da escola se ele simplesmente me tornasse um pouco mais clara. Mas acho que Deus não se impressionava com minhas moedas de troca porque Ele jamais atendeu aos meus pedidos.
E quando eu era adolescente meu ódio por mim mesma ficou ainda pior, como vocês devem imaginar que acontece na adolescência. Minha mãe me lembrava com frequência que ela me achava linda, mas isso não me consolava: ela é minha mãe, é claro que se espera que ela me ache bonita. Foi então que Alek Wek surgiu no cenário internacional. Uma modelo celebrada, negra como a noite, estava em todas as passarelas e em cada revista e todos falavam sobre o quanto ela era linda. Até a Oprah disse que ela era linda, o que tornou isso um fato. 
Eu não podia acreditar que as pessoas estavam aceitando uma mulher que se parecia tanto comigo como bonita. Minhas características físicas sempre foram um obstáculo difícil de vencer e, de repente, Oprah estava dizendo que não, elas não eram isso. Isso era espantoso e eu não queria aceitar isso porque eu estava começando a gostar da sedução da inadequação. Mas não dava para segurar a flor que estava desabrochando dentro de mim. 
Quando vi Alek eu, inadvertidamente, vi um reflexo de mim mesma que eu não podia refutar. Agora eu tinha molas nos pés, porque eu me sentia mais visível, mais valorizada pelos distantes porteiros da beleza, mas à minha volta a preferência por peles claras ainda prevalecia. Para os observadores que eu considerava importantes, eu ainda não era bonita. E minha mãe, de novo, me dizia: “Você não pode comer a beleza. Ela não te alimenta”. E essas palavras me atormentavam e aborreciam; eu não as entendi de verdade até finalmente compreender que a beleza não era algo que eu pudesse adquirir ou consumir, era algo que eu simplesmente precisava ser.
E o que minha mãe quis dizer quando me falou que não se pode comer a beleza foi que não se deve confiar no seu visual para se manter. O que é fundamentalmente belo é a compaixão por si mesma e por aqueles à sua volta. Esse tipo de beleza incendeia o coração e encanta a alma. É o que colocou Patsey em tantas dificuldades com seu senhor, mas também o que manteve sua história viva até hoje. Lembramos-nos da beleza de seu espírito, mesmo depois que a beleza de seu corpo se desvaneceu.
Assim, eu espero que minha presença no cinema e nas revistas possa levar você, jovem garota, em uma jornada parecida. Que você sinta a validação de sua beleza externa, mas também se dê conta do profundo trabalho de ser bela por dentro. Não há tons [jogo com os significados de shade, que pode ser sombra ou tom de cor] para essa beleza.

29 de nov. de 2013

Reflexões


“O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente” (Carlos Drummond de Andrade).

Eu adoro esse trecho do poema Mãos Dadas do Drummond. O poeta conseguiu definir em poucas palavras minha paixão por estudar História, relacionando o Tempo, o Presente e a Vida. Se o Tempo é a principal perspectiva da análise história, ela não se faz sem pessoas, tanto as que se foram quanto as que estão aqui nesse mundo.
Hoje lembrei desse trecho olhando os alunos do último ano do Ensino Médio comemorando seu último dia de escola. Apesar de diversos últimos, foi um dia muito alegre e muito vivo para aquela gurizada. A alegria e o alívio de encerrar um ano cheio de provas, aulas, trabalhos, discussões e (in)definições foi bonito de se ver. Os sorrisos e as fotos se espalhavam pelo corredor e no final tudo acabou em tinta, fotos e bagunça, muita bagunça (de branquear cabelos dos adultos).
E eu no meio de tanta alegria e festa, lembrando do Drummond e pensando o quanto a escola congrega de vidas e histórias. Quantos dias passados lá com eles, quanta falta eles farão, como será o futuro dessa gurizada? Como esse espaço social concentra pessoas diferentes, com trajetórias diferentes, com momentos e pensamentos diferentes.
Por isso não é fácil a convivência em muitos momentos, é muita vida junto, é muita experiência acumulada e a acumular, são muitas falas e falatórios e será muita saudade. Eles até podem respirar fundo agora pelo fim da maratona de avaliações, mas em Fevereiro de 2014, quando a mochila já estiver aposentada é que a ficha cairá. E o tempo, esse invento dos humanos, irá mostrar aos poucos o quanto esse período foi importante. E a memória, amiga da História, fará o jogo do lembrar e esquecer (com certeza esquecerão da matéria – quem foi Tiradentes mesmo? O que é hidrocarbonetos? – e lembrarão da Gincana, do dia em que o fulano tentou colar na prova da professora tal).
Espero que sejam mais lembranças boas que ruins. Espero que sejam felizes, espero que saibam aproveitar as oportunidades e que cresçam na vida. Espero que quando pararem para refletir sobre suas vidas, e pensarem sobre suas Histórias, tenham a certeza que escolheram caminhos produtivos. E não estou me referindo a dinheiro (que é ótimo e a vida capitalista solicita), falo de satisfação, satisfação de ser e estar no lugar e na vida que construíram para cada um.
Feliz 2014, anjinhos!

24 de out. de 2013

Produções Discentes


Vamos falar de coisas boas nas escolas? 

Pois quando pensamos em escola e principalmente em escolas públicas, vem a nossa cabeça um tsunami de problemas, dificuldades, desaforos, trabalho e descasos. Sim, realmente existe esse "caos" educativo e o objetivo aqui não é discordar disso. Entretanto, dizem que todo o "caos" é criativo e em meio a esse turbilhão há momentos e situações positivas que merecem ser relatadas, comentadas e divulgadas por aí. 
É necessário uma posição diante das dificuldades, mas eu prefiro começar falando do que está dando certo para depois reivindicar e rever o que está errado. Relembrando, mais uma vez, que é somente a minha opinião, não quer dizer que é "a verdade" ou "a correta".

A partir disso, vou apresentar algumas produções textuais dos discentes do terceiro ano do Ensino Médio de uma escola pública de Porto Alegre que merecem ser destacadas. Adianto que as produções foram cedidas pelos autores e que realmente merecem a leitura.

O tema da redação era o seguinte: "Gonçalves é um angolano nascido em Luanda que veio para o Brasil passar as férias. Além da curiosidade por conhecer as paisagens brasileiras, Gonçalves queria conhecer mais sobre a escravidão que aconteceu aqui. Como boa parte dos escravos que aportaram para o Brasil vieram de Angola, Gonçalves queria entender o que aconteceu com seus antepassados depois que eles atravessaram o Oceano Atlântico.
Você é muito amigo(a) do angolano e sabe que ele está vindo para o  Brasil. Escreva um texto relatando como tu contarias esse passado escravista brasileiro para o Gonçalves, onde você poderia levar ele, qual a influência dos africanos no país. Além de contar um pouco sobre esses 300 anos de regime escravista, é necessário comentar sobre a situação dos afrodescendentes atualmente. Como ficaram os escravos depois da abolição? Qual a situação dos negros hoje em dia no nosso país?"

A primeira redação a ser publicada é da aluna Gabriela da Rosa Neto:

Ao desfrutar os cocais do litoral, as praias de Copacabana, as matas amazônicas, e o frio gaúcho, você perceberá que não há outro lugar como o Brasil, um país cheio de corrupção política, um país onde a população se preocupa com as novelas da Globo, e com coisas que não fazem sentido e esqueçam que na vida real ainda há pessoas passando fome e falta de educação e hospitais, mas além de todos esses desastres culturais, um dos aspectos mais polêmicos é justamente a questão do negro em relação ao resto da população, é um fato historicamente triste que atinge uma boa parte da população.
O Brasil é um país de miscigenações, onde os índios nativos se escondem, os negros ainda sofrem influências do passado e o branco (colono) sempre se apodera de tudo, os costumes e conceitos etnocêntricos não mudaram muito hoje em dia, em pleno século XXI. No Brasil os “negros” ou “afrodescendentes”, possuem baixas condições econômicas, onde um suposto negro pós-graduado com mestrado e doutorado, muitas vezes ganha uma porcentagem inferior que a de um homem branco que trabalha na mesma área, mas não precisou se esforçar tanto para garantir sucesso na vida, a situação só piora para as mulheres negras, tendo uma porcentagem ainda menor em relação ao salário do homem negro, do homem branco e até mesmo da mulher branca, – quanto a isso, meu amigo Gonçalves, podemos dizer que não será nada fácil pra você, – pois ainda há um notável preconceito no mercado de trabalho, quanto  a questão genérica ou étnica.
Na região Sul do Brasil não há muita descendência negra, é uma etnia mais habitada para o litoral Norte e Nordeste do Brasil, pois na época da escravidão era mais fácil transportá-los dos navios negreiros chegados da África para o litoral do Brasil. A Bahia era o estado que mais produzia cacau na época, e era a região que mais havia escravos para produzir mais cacau e vender ao exterior, mais fluentemente entre a época do Brasil Colônia ao Imperialismo de Dom João VI, que foi uma época bastante conturbada para quem nasceu na África, até porque era abundante o comércio de escravos, estes eram vendidos como produtos e mão de obras baratas.
A Abolição da Escravidão, em 1888, e consequentemente a Proclamação da República, em 1889, não adiantaram de nada para as condições de quem trabalhava para “senhores de engenho”, muitos deles já não tinham oportunidades de emprego e não tinham como se sustentar, portanto, estes se acolheram em cortiços e morros, dando início a uma serie do que viria a ser a pobreza do negro hoje em dia, por isso a maioria, ainda hoje mora em vilas e têm mínimas condições econômicas, outros poucos se contentaram com o sistema, foram à luta e conseguiram mudar de vida econômica.
Ainda durante o século XX, foi uma época difícil para quem nasceu negro, pois ainda havia preconceitos e insultos, na década de 1950 algumas famílias negras ainda trabalhavam nas casas de pessoas brancas, mas isso não era visto como escravidão, pois essas famílias sustentavam os filhos dos trabalhadores e ainda davam um troquinho pela recompensa. Mas na década de 1980 foi legalizada uma lei, dizendo que era crime discriminar uma pessoa pela aparência externa, ou mais precisamente, descriminar um negro pela cor da pele ou pelas condições de vida. E por lei é permitido que todo o ser humano, seja lá qual etnia for, deve ser tratado como um cidadão, com direitos iguais, como todos os demais, pensando nisso, o sistema resolveu concretizar as Cotas Raciais nas Universidades, já que poucos têm condições de pagar para estudar em universidades públicas ou federais, enquanto outros têm que trabalhar muito para pagar os estudos, embora essa política não sirva somente para os negros, pois não adianta nada um negro ter estudado o ensino médio inteiro em escola particular, esse sistema vale para quem estudou durante todo o ensino médio em escola pública e que tenha uma renda média per capita de um salário mínimo.
Hoje em dia ainda é permitido dançar e lutar Capoeira pelas ruas, antes quem fizesse tais amostragens era condenado a no mínimo seis meses de cadeia, isso é um absurdo, mas depois da abolição da escravidão, da República Velha, e durante a década de 30, Vargas havia visto uma dessas danças e achou muito bom, então ele legalizou para que fosse possível dançar capoeira livremente na rua, também tem o Carnaval, criada e incentivada pelos negros na mesma época.
Conclui-se que o negro é a cara do Brasil, é a etnia que fez o Brasil ser o que é hoje, em questão de produção e em questões culturais. Mas o Brasil negro se esconde atrás da cara branca, ou seja, a população brasileira não se espelha na África, na verdade, o brasileiro se influencia com os costumes europeus.


20 de out. de 2013

Do Congo ao Brasil

Encontrei essa reportagem do Opera Mundi sobre uma refugiada do Congo que por acaso fugiu para o Brasil. Uma história de vida muito trágica e cotidiana de regiões africanas que permanecem durante anos em conflito.

Vale a pena a leitura!



A refugiada congolesa que chegou ao Brasil por acaso


Ornela Mbenga Sebo tem hoje 23 anos. Ela vivia com seus pais e duas irmãs em uma casa confortável na cidade de Walikale, na província de Kivu do Norte, na República Democrática do Congo. Era uma quarta-feira no mês de janeiro em 2011, quando sua vida mudou. Como de costume, acordou cedo, tomou banho, fez a refeição com sua família e despediu-se para mais um dia de trabalho sem saber que aquela seria a última vez que veria seus parentes.
Desde a década de 90, o Congo vive um conflito político e civil. Mobutu Sese Seko governou o país desde 1965. Após o seu exílio forçado, em 1997, o líder opositor Laurent D. Kabila passou a ocupar o cargo da presidência. Foi neste momento que grupos de origem ruandesa se revoltaram contra Kabila, que acabou assassinado em 2001 por seu guarda-costas. Com isso, o filho, Joseph Kabila, assumiu seu lugar.Após ser eleito presidente em 2006, Kabila atuou para desmobilizar vários grupos opositores, mas o ano de 2011 marcou mais uma investida de crimes que assolaram várias cidades congolesas.
A grave crise humanitária que acometeu o Congo já deixou quatro milhões de mortos em razão de combates armados, mas também devido a fome e doenças. Por pouco Ornela sobreviveu e teve um destino que jamais poderia imaginar. Ela foi violentada e escravizada, mas conseguiu fugir em um navio mercante rumo ao Brasil. No Rio de Janeiro, a jovem do Congo contou sua história rica a Opera Mundi.


O dia em que tudo mudou


Aos 21 anos de idade, Ornela viu sua casa ser incendiada e se perdeu da família. “Começou o bombardeio e tiros. A gente pensou que era uma coisa passageira, mas não passou. Quando acalmou, saí do trabalho para tentar chegar em casa e vi minha casa pegando fogo”, lembrou.
Desde pequena, seu pai lhe contava que a guerra já acontecia havia tempos. “É muito difícil sentir na pele. Fiquei desesperada. Pensava que meus pais estavam lá dentro da casa pegando fogo. O governo não faz nada e a polícia é a primeira a sair da cidade”, disse.
Walikale ficou irreconhecível com prédios incendiados e destruídos. Embora a iminência de um conflito em Kivu do Norte sempre estivesse presente e os moradores se preparassem para fugir das cidades e seguir em direção à capital, Kinshasa, a família de Ornela não previra o ataque. A onda de violência veio sorrateira e devastou a vida de milhares de pessoas.
“Eram opositores de Ruanda e Burundi. Desde que a gente mudou o presidente, esse conflito começou. Quando a gente ouvia que ia ter guerra, saíamos da cidade e seguíamos para Kinshasa. Dessa vez aconteceu assim de repente”, narrou.
Em choque e sem saber a quem recorrer, a jovem se juntou a um grupo de pessoas,em direção a Kinshasa. A esperança era encontrar avós que viviam na capital.
Foram longos dias de caminhada debaixo de sol, chuva e vento. “Não tinha certeza se estavam vivos, mas queria encontrar minha outra família. Fugi a pé. Andamos duas semanas. Encontrei com pessoas que estavam fugindo também, eram idosos, crianças, mulheres e homens”.
Ornela narra com detalhes sua jornada. Ao longo dos dias, ela atravessava cidades inteiras a pé, aparentemente fantasmas. “Não tinha mais ninguém, havia mortos pendurados. Passamos numa cidade que tinha gente morta na rua, cachorros comendo corpos, cidades destruídas. Tenho vivo na memória, quando conto, parece que volto no lugar de novo”.



Ataques



Apesar das intempéries do caminho, o maior perigo era ser atacada por grupos que “andavam de cidade em cidade procurando gente para matar”.  
“Fingi estar morta. Botei sangue de alguém no meu corpo, coloquei uma pessoa morta em cima de mim e prendi a respiração. Chegaram perto, me chutaram para ver se eu estava viva e foram embora. Eu continuei a caminhada”, relatou.
Até que em mais um cerco, a jovem não escapou e foi capturada. Perguntada se chegou a ter medo de morrer, ela disse: “naquela hora não, não tinha mais sentimento, já que meus pais não estavam, perdi a esperança, não sabia o que fazer”.
Em um grupo de 60 pessoas, Ornela foi levada à força para a Tanzânia. Sua função era buscar água para os sequestradores diariamente no porto de uma cidade que nunca soubera o nome. “Fui para a Tanzânia sendo escravizada. Prendiam a gente com força para dormir com eles, lavar roupa e fazer comida. Eles comiam e depois botavam a comida no chão para a gente comer. Eu dormia no chão em um acampamento. Sofri moralmente, física e mentalmente. Uma senhora que não queria dormir com eles, mataram cortaram ela (sic) na frente da gente. Bateram em mim algumas vezes, levei tapas, chutes”, descreveu.
Era um grupo de cerca de 30 pessoas, munidas de armas, granadas e facões. Ela lembra ouvi-los falar em rádio no idioma swahili. “Acho que o governo sabia dessas coisas. Eles falavam que iam matar todo mundo”.
Em uma de suas idas e vindas ao porto para buscar água – eram mais de 30 baldes por dia – Ornela conheceu um rapaz que ficou intrigado por ver sempre a moça com a mesma roupa. “Foi o rapaz que me ajudou a fugir. Ele me via todo dia com a mesma roupa quando eu ia pegar água. Tinha medo, não confiava mais em ninguém”.
O rapaz ganhou sua confiança e, como trabalhava no porto, arranjou que ela embarcasse escondida em um navio mercante e disse “você vai fugir para qualquer lugar que for”.



A fuga



Era uma madrugada em fevereiro, quando pulou o muro e entrou em um navio escondida. “Era uma questão de vida ou morte. Ele me deu um saco de amendoim e fiquei onde estava o lixo do navio”.
Ele se chamava Papy. Ornela nunca mais se esqueceu do nome do rapaz que salvou a sua vida. “É muito difícil encontrar alguém que quer te ajudar sem nada de volta. Ele me ajudou bastante”.
Foram duas semanas de viagem no escuro sem poder sair do depósito de lixo. Sem perguntar para onde ia, exausta e sem documentos, a jovem apenas sonhava em se ver livre dos rebeldes.
Moribunda, dias depois desembarcou numa cidade portuária. “Fui andando procurando alguma coisa para comer. Perguntei: eu tô aonde? E responderam, você está no Brasil”.
Ela falava português por ter estado em Angola anos antes. A jovem do Congo estava em Santos. “Fui perguntando se tinha trabalho e o dono de um bar me deu um suco e um salgado. Falei que vinha do Congo e tinha acabado de chegar. Um cara do lado disse que conhecia um angolano me levou até ele. Tudo isso aconteceu no mesmo dia”. Foi acolhida por um estudante angolano que se solidarizou com sua história e, em menos de um mês, a chegava no Rio de Janeiro para ser recebida por conterrâneos.
“Me mandaram dinheiro para comprar passagem de ônibus. Foi o momento mais feliz quando me receberam. Todos choraram. Eles disseram que iam ajudar a procurar minha família. Foram meus anjos da guarda”, disse.
No Rio, Ornela reconstruiu sua vida. Ela vive no bairro de Irajá, no subúrbio carioca, com os quatro amigos – Felly, Freddy, Raule e Rodrigue. Obteve o status de refugiada no Brasil e tem o direito de viver e trabalhar como qualquer cidadão brasileiro.
Com a ajuda da Cáritas, entidade que trabalha em parceria com o governo brasileiro e a ONU para acolher refugiados, Ornela conseguiu um emprego de recepcionista no Parque Tecnológico da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Lá fez inúmeras amizades, mas faltava ainda uma coisa para que se sentisse com a vida reconstruída. Ela queria encontrar algum parente.



O reencontro



Desde 2011, nunca mais falou com ninguém de sua família. Com uma conta do Facebook, seu tio que vive na França a localizou e quase um ano depois seus pais também a encontraram.
“Mobilizaram gente para encontrar meus pais, foi gente na minha cidade com fotos procurando. Demorou uns 10 meses para encontrar. No ano passado eu estava no trabalho, meu celular tocou e ouvi uma voz diferente. Era minha mãe. Chorei muito. Era tanta alegria, tudo o que eu queria. Mãe você está viva? Eu parei aqui no Brasil... não sei bem explicar”.
No dia do incêndio da casa em 2011, seus pais e irmãs se esconderam num bunker construído no subsolo, mas conseguiram sair antes da casa pegar fogo e fugiram para o Senegal. Hoje, sua família vive em Chicago, nos Estados Unidos.
“Esse foi o momento mais, mais, mais feliz da minha vida. Sempre fui muito apegada aos meus pais. Agradeço todos os dias”, salientou.
Sua meta é visitar a família. Quer passar o Natal com os pais. Sensibilizados, seus colegas lançaram uma campanha pela internet de crowdfunding para arrecadar dinheiro e ajudar a pagar sua passagem de avião. Ela pretende ficar perto dos pais e irmãs.
A história vai virar livro também, pois Ornela topou contar em detalhes passagens de sua vida para uma biografia. Uma coisa é certa para a jovem refugiada do Congo: não pretende voltar tão cedo para seu país. “Não pretendo voltar. É meu país, eu amo, sou africana, sou do Congo, mas só voltaria se a situação estivesse mais segura. Aí posso voltar, mas não para morar, só para visitar meus avós que continuam lá”.