Total de visualizações de página

29 de mai. de 2013

Comissão da Verdade - Depoimentos

Texto retirado daqui.


Comissão da Verdade do Rio ouve historiadora que teve corpo usado em 'aula de tortura'


Dulce Pandolfi à esquerda e Lúcia Murat à direita.
A historiadora Dulce Pandolfi e a cineasta Lúcia Murat emocionaram os integrantes da Comissão Estadual da Verdade e as pessoas que acompanharam seus depoimentos nesta terça-feira (28) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Durante cerca de uma hora, elas relataram as agressões sofridas em quartéis e prisões no período da ditadura militar (1964-1985) e foram aplaudidas de pé pelos ouvintes. Dulce contou, inclusive, que seu corpo foi usado em uma aula de interrogatório que teve demonstração de choques elétricos e simulação de fuzilamento.
Primeira a falar, Dulce Pandolfi emocionou-se em diversos momentos e precisou fazer pausas. Atualmente pesquisadora da Fundação Getulio Vargas, Dulce tinha 21 anos e era membro da Aliança Nacional Libertadora (ANL) quando foi presa em 20 de agosto de 1970. Ela passou um ano e quatro meses em poder dos militares e disse que foi torturada psicológica e fisicament durante três meses no quartel da Polícia do Exército, onde funcionava o Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi). "Quando entrei, ouvi uma frase que até hoje ecoa nos meus ouvidos: 'Aqui não existe Deus, nem pátria, nem família'".
No quarto mês de prisão, Dulce ficou no Departamento de Ordem Política e Social (Dops), no centro do Rio, e, nos seis meses seguintes, foi mantida no presídio Talavera Bruce, em Bangu, até ser transferida para o presídio Bom Pastor, em Recife, sua terra natal.
A historiadora lembrou que o período mais severo foi o início, na primeira sessão de tortura, quando os militares tentaram obter o maior número possível de informações antes que seu desaparecimento fosse constatado pela ANL e por familiares. O método mais usado foi o choque elétrico, com o corpo molhado e preso ao pau-de-arara, contou Dulce, que foi também espancada e teve um jacaré colocado sobre seu corpo nu. A "aula de tortura", para demonstrar a eficácia dos choques elétricos em cada parte do corpo, foi quando ela completou dois meses de prisão. Ela não resistiu, precisou ser socorrida, mas a "aula" continuou momentos depois, com respaldo médico, no pátio do quartel. Foi aí que houve a simulação de fuzilamento, com militares apontando para ela um revólver com apenas uma bala.
"Essas coisas não podem ser naturalizadas. É como a miséria, é como ver uma pessoa caída no chão e achar normal. Esse é o grande ponto", disse Dulce Pandolfi após o depoimento.


A cineasta Lúcia Murat também foi espancada e sofreu choques elétricos e até abuso sexual por parte dos militares. Ela foi presa pela primeira vez em outubro de 1968, em um congresso estudantil, mas ficou apenas uma semana detida. Com a publicação do Ato Institucional 5 (AI-5), em dezembro daquele ano, com medo da prisão, Lúcia passou a viver na clandestinidade, mas foi encontrada e levada em 1971 para o mesmo quartel em que Dulce foi presa, e ficou detida três anos e meio.
Lúcia contou que as primeiras horas de tortura foram as mais intensas e que chegou a perder os movimentos das pernas por algum tempo. Na tentativa de se suicidar, ela chegou a enganar os militares para ser levada a uma varanda, fazendo-os acreditar que daria sinal para militantes, mas uma substituta encenou no lugar dela: "Foi a pior sensação da minha vida. A de não poder morrer". Lúcia chegou a ser levada para Salvador, onde foi apenas interrogada, e trazida de volta ao Rio de Janeiro. Em outra ocasião, ao participar de uma auditoria na Marinha, denunciou a tortura perante juízes militares, que a mandaram de volta para o DOI-Codi, onde sofreu deboche e mais sessões de tortura.


Tanto Dulce Pandolfi quanto Lúcia Murat destacaram o sadismo dos militares durante as sessões de tortura, embora lembrassem que foram tratadas de forma "mais humana" por outros. As duas contaram que um soldado se ofereceu para levar bilhetes para seus parentes e que as mensagens chegaram aos destinatários.
O coordenador da comissão e presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio de Janeiro, Wadih Damous, disse que o objetivo das sessões é sensibilizar a população: "É preciso mostrar, sobretudo aos mais jovens, que a tortura foi uma política de Estado e que pessoas corriam risco de vida por pensar [de maneira] diferente". Ele informou que estão previstos outros depoimentos, inclusive de agentes civis e militares da época.
Diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque considerou fortes os depoimentos e disse que eles são uma forma de olhar para problemas atuais: "Foi o relato de um momento histórico em que o governo foi carrasco, foi algoz. Esses trabalhos são também para convidar a sociedade e os jovens a refletir sobre essa história e a enfrentar os problemas que ainda persistem hoje. No momento em que estamos ouvindo esses relatos, há pessoas sendo torturadas nas prisões".

28 de mai. de 2013

Como conversar com meninas

A mudança está nas novas gerações

Mais uma vez, posto um texto muito bacana sobre crianças. Agora o foco são as meninas que desde muito cedo (ou melhor, desde a descoberta do sexo do bebê) estão sendo educadas, estimuladas, influenciadas, treinadas dentro de uma cultura extremamente machista. Precisamos não criar "princesas", mas garotas que pensem e entendam que a loucura da beleza perfeita é um caminho de muito estresse, pressão, gasto e sofrimento.
O texto foi retirado daqui.

Não, não é um guia de paquera para garotos tímidos. Este texto da Lisa Bloom nos faz pensar sobre as consequências que nossas atitudes podem ter na educação das crianças, e como podemos mudar parâmetros sociais apenas conversando de modo diferente com uma menininha, segurando o impulso de dizer o quanto ela é linda para surpreendê-la ao ressaltar as outras qualidades que ela tem. Vale dizer que a educação dos meninos também precisa ser repensada, e que autora já escreveu sobre os dois.


Como conversar com meninas

Eu fui a um jantar na casa de uma amiga na semana passada, e encontrei sua filha de 5 anos pela primeira vez. A pequena Maya tinha os cabelos castanhos e cacheados, olhos escuros, e estava adorável em seu vestidinho rosa e brilhante. Eu queria gritar, “Maya você é tão fofa! Veja só! Dê uma voltinha e desfile esse vestidinho rosa, sua coisinha linda!”
Mas eu não fiz isso. Eu me contive. Como sempre me contenho quando conheço garotinhas, negando meu primeiro impulso, que é dizer o quão fofas/lindas/bonitas/bem vestidas/de unhas feitas/cabelo arrumado elas são/estão.
“O que há de errado nisso? É a conversa padrão de nossa cultura para quebrar o gelo com as meninas, não é? E por que não fazer-lhes um elogio sincero para elevar suas auto-estimas? Porque elas são tão lindas que eu simplesmente quero explodir de tanta fofura quando as encontro, sinceramente.”
Guarde este pensamento por um tempo.
Esta semana a ABC News informou que quase metade das meninas de 3 a 6 anos se preocupam por estarem gordas. No meu livro, Think: Straight Talk for Women to Stay Smart in a Dumbed-Down World, eu revelo que 15 a 18% das meninas com menos de 12 anos usam rímel, delineador e batom regularmente; distúrbios alimentares estão em alta e a auto-estima está em baixa; e 25% das jovens mulheres americanas prefeririam vencer o America’s Next Top Model a ganhar o prêmio Nobel da Paz. Até universitárias inteligentes e bem sucedidas dizem que preferem ser ‘gostosas’ a serem inteligentes. Recentemente uma mãe de Miami morreu durante uma cirurgia estética, deixando dois filhos adolescentes. Isso não pára de acontecer, e isso parte o meu coração.
Ensinar as meninas que a aparência delas é a primeira coisa que se nota ensina a elas que o visual é mais importante do que qualquer outra coisa. Isso as leva a fazer dieta aos 5 anos de idade, usar base aos 11, implantar silicone aos 17 e aplicar botox aos 23. Enquanto a exigência cultural de que as garotas sejam lindas 24 horas por dia se torna regra, as mulheres têm se tornado cada vez mais infelizes. O que está faltando? Um sentido para a vida, uma vida de ideias e livros e de sermos valorizadas por nossos pensamentos e realizações.
Eu me esforço para falar com as meninas assim:
“Maya,” eu disse, me ajoelhando até ficar da sua altura, olhando em seus olhos, “prazer em conhecê-la”.
“O prazer é todo meu,” ela disse, com a voz já bem treinada e educada para falar com adultos como uma boa menina.
“Hey, o que você está lendo?” Perguntei, com um brilho nos olhos. Eu amo livros. Sou louca por eles. Eu deixo isso transparecer.
Seus olhos ficaram maiores, e ela demonstrou uma empolgação genuína, mas contida, sobre o assunto. Ela pausou, no entanto, tímida por estar com um adulto desconhecido.
“Eu AMO livros,” eu disse. “E você?”
A maioria das crianças gosta de livros.
“SIM,” ela disse. “E agora eu consigo ler sozinha!”
“Que incrível!” eu disse. E é incrível, para uma menina de 5 anos.
“Qual é o seu livro preferido?” perguntei.
“Vou lá pegar! Posso ler pra você?”
Purplicious foi a escolha de Maya, um livro novo para mim, e Maya se sentou junto a mim no sofá e leu com orgulho cada palavra em voz alta, sobre a nossa heroína que adora rosa mas é perturbada por um grupo de garotas na escola que só usam preto. Infelizmente, o livro era sobre garotas e o que elas vestiam, e como suas escolhas de roupas definiam suas identidades. Mas depois que Maya virou a última página, eu conduzi a conversa para as questões mais profundas do livro: meninas más e pressão dos colegas, e sobre não seguir a maioria. Eu contei pra ela que minha cor preferida é o verde, porque eu amo a natureza, e ela concordou com isso.
Em nenhum momento nós discutimos sobre as roupas, o cabelo, o corpo ou quem era bonita. É surpreendente o quão difícil é se manter longe desses tópicos com meninas pequenas, mas eu sou teimosa!
Eu falei para ela que eu tinha acabado de escrever um livro, e que eu esperava que ela escrevesse um também, algum dia. Ela ficou bastante empolgada com essa ideia. Nós duas ficamos muito tristes quando Maya teve que ir pra cama, mas eu disse a ela para da próxima vez escolher outro livro para lermos e falarmos sobre ele. Ops! Isso a deixou animada demais para dormir, e ela levantou algumas vezes…
Aí está, um pouquinho de oposição a uma cultura que passa todas as mensagens erradas para as nossas meninas. Um empurrãozinho em direção à valorização do cérebro feminino. Um breve momento sendo um modelo a ser seguido, intencionalmente. Meus poucos minutos com a Maya vão mudar a multibilionária indústria da beleza, os reality shows que diminuem as mulheres, a nossa cultura maníaca por celebridades? Não. Mas eu mudei a perspectiva de Maya por pelo menos aquela noite.
Tente isto da próxima vez que você conhecer uma garotinha. Ela pode ficar surpresa e incerta no começo, porque poucos perguntam sobre sua mente, mas seja paciente e insista. Pergunte-a o que ela está lendo. Do que ela gosta ou não gosta, e por quê? Não existem respostas erradas. Você apenas está gerando uma conversa inteligente que respeita o cérebro dela. Para garotas mais velhas, pergunte sobre eventos atuais: poluição, guerras, cortes no orçamento para educação. O que a incomoda no mundo? Como ela consertaria se tivesse uma varinha mágica? Você pode receber algumas respostas intrigantes. Conte a ela sobre suas ideias e conquistas e seus livros preferidos.Mostre para ela como uma mulher pensante fala e age.

21 de mai. de 2013

Dicionário feito por crianças


Olhem que reportagem bacana e que ideia genial (daquelas que tu querias ter pensado antes da pessoa fazer).
A reportagem foi retirada daqui.



Dicionário feito por crianças revela a adultos um mundo que já esqueceram



Um professor colombiano passou dez anos coletando definições de seus alunos e, como resultado, obteve um dicionário com verbetes ao mesmo tempo puros, lógicos e reais

A Feira do Livro de Bogotá, que aconteceu no final de abril, teve como maior sucesso um livro chamado “Casa das estrelas: o universo contado pelas crianças”. Mais especificamente, uma parte dele: um dicionário feito por crianças que traz cerca de 500 definições para 133 palavras, de A a Z.
Apesar de lançado originalmente em 1999, o livro foi reeditado neste ano. Javier Naranjo, o autor, conta que compilou as informações durante dez anos enquanto trabalhava como professor em diferentes escolas do estado de Antioquía, região rural do leste do país.
A ideia surgiu quando, em uma comemoração do Dia das Crianças, ele pediu que seus alunos definissem a palavra “criança”. O resultado encantou o professor – uma das definições era “uma criança é um amigo que tem o cabelo curtinho, não toma rum e vai dormir mais cedo”. A partir daí foram surgindo novas definições, que eram sempre anotadas e guardadas.
Para ele, as crianças têm uma lógica diferente, uma maneira própria de entender o mundo e de revelar muitas coisas que os adultos já esqueceram. É assim que, no peculiar dicionário, o adulto é uma “pessoa que em toda coisa que fala, fala primeiro de si”,  água é uma “transparência que se pode tomar”, um camponês “não tem casa, nem dinheiro. Somente seus filhos” e a Colômbia é “uma partida de futebol”.
Confira alguns dos verbetes encontrados no livro.
Os Verbetes

Adulto: Pessoa que em toda coisa que fala, fala primeiro dela mesma (Andrés Felipe Bedoya, 8 anos)
Ancião: É um homem que fica sentado o dia todo (Maryluz Arbeláez, 9 anos)
Água: Transparência que se pode tomar (Tatiana Ramírez, 7 anos)
Branco: O branco é uma cor que não pinta (Jonathan Ramírez, 11 anos)
Camponês: um camponês não tem casa, nem dinheiro. Somente seus filhos (Luis Alberto Ortiz, 8 anos)
Céu: De onde sai o dia (Duván Arnulfo Arango, 8 anos)
Colômbia: É uma partida de futebol (Diego Giraldo, 8 anos)
Dinheiro: Coisa de interesse para os outros com a qual se faz amigos e, sem ela, se faz inimigos (Ana María Noreña, 12 anos)
Deus: É o amor com cabelo grande e poderes (Ana Milena Hurtado, 5 anos)
Escuridão: É como o frescor da noite (Ana Cristina Henao, 8 anos)
Guerra:Gente que se mata por um pedaço de terra ou de paz (Juan Carlos Mejía, 11 anos)
Inveja: Atirar pedras nos amigos (Alejandro Tobón, 7 anos)
Igreja: Onde a pessoa vai perdoar Deus (Natalia Bueno, 7 anos)
Lua: É o que nos dá a noite (Leidy Johanna García, 8 anos)
Mãe: Mãe entende e depois vai dormir (Juan Alzate, 6 anos)
Paz: Quando a pessoa se perdoa (Juan Camilo Hurtado, 8 anos)
Sexo: É uma pessoa que se beija em cima da outra (Luisa Pates, 8 anos)
Solidão: Tristeza que dá na pessoa às vezes (Iván Darío López, 10 anos)
Tempo: Coisa que passa para lembrar (Jorge Armando, 8 anos)
Universo: Casa das estrelas (Carlos Gómez, 12 anos)
Violência: Parte ruim da paz (Sara Martínez, 7 anos