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2 de abr. de 2014

Ditadura Civil-Militar e Educação

Devido a correria do cotidiano de professora e estudante, perdi as datas de 31 de Março e 01 de Abril para postar algum conteúdo relacionado aos 50 anos do golpe militar no Brasil.
Entretanto, o ano é do cinquentenário e o assunto é bem presente neste blog. Postarei hoje uma reportagem do jornal Correio do Povo sobre a educação brasileira no contexto da ditadura. Para acessar diretamente no site, clique aqui.

Regime Militar deu golpe na educação do Brasil

Nos 50 anos da tomada de poder pela Ditadura, professores avaliam os prejuízos para o ensino

Nos 50 anos da tomada de poder pela Ditadura, professores avaliam os prejuízos para o ensino- Crédito: André Ávila
Nos 50 anos da tomada de poder pela Ditadura, professores avaliam os prejuízos para o ensino
Crédito: André Ávila
Na noite do dia 31 de março de 1964, o regime político vigente no Brasil sofreu um golpe. Mas o País seria golpeado muitas vezes até 1985. Para permanecer no poder, os militares prendiam, torturavam e manipulavam. A censura aos meios de comunicação limitou o acesso à informação dos brasileiros e também foi aplicada nas escolas, causando prejuízos com reflexos até hoje. 

Enquanto nos porões da ditadura, os que se opunham ao governo eram até mesmo mortos, na superfície, a tentativa era mostrar que o Brasil estaria vivendo um milagre econômico. A campanha ufanista da época encorajava a população a acreditar que vivia em um país do futuro, sem saber detalhes da repressão, ou de dados que desfavorecessem o regime. 

Certos livros considerados subversivos por qualquer motivo eram retirados do conteúdo bibliográfico dos colégios e das universidades. Os professores precisavam ficar atentos ao que falavam por medo de alunos e colegas infiltrados. O recado para se calarem era enviado através do sumiço de outros docentes. Além disso, houve reformas e inclusão de disciplinas com teor nacionalista. A mudança nos currículos na década de 1960 criou duas novas matérias: Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política do Brasil (OSPB). O objetivo era transmitir a ideologia da Segurança Nacional. 

“Aparentemente, estávamos vivendo uma normalidade, mas nós sabíamos que não era bem assim”, descreve a professora de História, Ione Osório, 76 anos. Mãe de três filhos pequenos na época do golpe, dava aula na Escola Estadual Cristóvão Mendonza Caxias do Sul e, mais tarde, no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, o Julinho, em Porto Alegre. Ela lembra que a inclusão das duas novas matérias foi motivo de discussão, porque delegados de fora do colégio foram incumbidos de ministrar as aulas. “O currículo era para dar a aparência de que o Brasil era um modelo sob a gestão daquele governo, mas a estatística não era verdadeira. Os números eram maquiados, inclusive o de reprovados”, comenta. “Eu era coordenadora da História do Julinho e lutamos para que os próprios professores da escola dessem essas aulas. Dessa forma, adaptamos o currículo”, lembra esboçando um sorriso ao recordar da forma que encontrou para driblar o governo e de transformar a emenda das duas cadeiras nacionalistas em conteúdos de História do Brasil e de Geografia, transmitidos de forma mais crítica. 

Censura em sala de aula

Na Serra, logo no início do regime, a professora lembra uma ocasião em que ensinava regimes políticos. “Passava alguns exemplos do que acontecia no mundo e no Brasil”, conta. Ela ressalta que mencionava o que ocorria no país, mas não colocava o conteúdo da aula no papel por temer ser chamada pelos militares para dar explicação. “Sabíamos que muitos professores e alunos eram ligados ao regime e havia infiltrados”, diz. Essa era outra maneira de contornar a censura. Porém, um estagiário distribuiu à classe um programa não oficial. “Eu havia orientado que não colocasse no papel, mas acho que ele quis se expressar. A cópia em mimeógrafo foi parar no Comando do Exército e, depois disso, ele sumiu. Não concluiu o curso de História na universidade”, descreve sem conseguir controlar as lágrimas, enquanto lembrava também da detenção de cinco alunos.

Atualmente Ione é presidente da Fundação de Apoio ao Colégio Estadual Julio de Castilhos e voltou a uma das classes onde ministrava História para contar sobre os anos de chumbo. “Aqui no Julinho, a resistência era mais aberta, mas também havia na escola delegados do Departamento de Ordem Política e Social (Dops). O Grêmio Estudantil foi extinto”, diz. 

Memória da Ditadura ainda é recuperada

Segundo a professora, em razão da tentativa de controlar a informação, a memória sobre aqueles anos, só foi recuperada depois. “Nem nós que tínhamos interesse, sabíamos de tudo que ocorria”, declara, afirmando que a maioria da população só passou a tomar pé da situação, na década de 1980, após a abertura. “Até hoje, muitas coisas não foram elucidadas e ainda estamos descobrindo. A história nunca termina”, observa. “Acho importante tudo o que leva à verdade, mesmo que seja tarde.”

Regimes autoritários exaltam o nacionalismo

A professora de pós-graduação da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs), Maria Helena Bastos, assegura que todo regime autoritário costuma exaltar o nacionalismo e criar o sentimento de nação. Para ela, algumas mudanças no currículo foram responsáveis pela implementação de métodos que não estimulavam o pensamento crítico. “Formamos jovens para marcar cruzinhas”, descreve, avaliando que esse tipo de ensino não mudou muito efetivamente de lá para cá. 

Lembra ainda que os acordos e reformas não foram exclusividade do Regime Militar. Algumas versões já haviam sido ensaiadas. “Os acordos já vinham sendo gestados antes”, diz. 

Maria Helena observa que indiscutivelmente o controle à informação representou uma lacuna e atrasou o ensino. Eram diferentes formas de repressão, incluindo a proibição de livros, programas de TV e filmes. “Lembro de ler livros encapados”, diz. Porém, pondera que a censura sempre fez parte da história do Brasil desde o Império. “Portugal filtrava tudo o que vinha para cá”, afirma.

Contudo, observa que os malefícios do período militar ao ensino são relativos, já que houve alterações positivas no ensino universitário e de pós-graduação através de alguns acordos, por exemplo. Ela também lembra que houve expansão entre 1973 e 1985 da matrícula nas escolas em torno de 40%, apesar de essa ampliação do acesso não vir acompanhada de qualificação. “A memória tem sempre dois lados.”

Queda da qualidade do ensino público

Para o autor do livro Golpe na Educação, professor Luiz Antonio Cunha, as políticas educacionais durante o governo militar tinham o objetivo de cristalizar uma ideia de que a sociedade estaria em processo de degeneração. “A concepção da educação pública como elemento de regeneração da sociedade é herdada tanto do cristianismo, quanto do positivismo”, analisa. Por isso, foi reforçado o ensino religioso e, implementadas disciplinas com cunho nacionalista.

Outra vertente, explica o sociólogo, doutor em Filosofia e mestre em Planejamento Educacional, Luiz Antonio Constant Rodrigues da Cunha, foi a concepção de que o ensino seria um instrumento de acumulação de capital. “Se plantou essa ideia naquela época. Isso cresceu e deu muitos frutos colhidos até hoje”, ressalta. As consequências, segundo ele, foram subsídios para o fortalecimento do setor privado em todos os níveis. “Secretarias de educação foram assumidas por empresários em muitos estados, que fizeram com que a qualidade caísse nas escolas públicas”, observa. No período, também houve queda nos salários do Magistério. “Isso forçou uma demanda de educação privada”, afirma.

Em Minas Gerais, por exemplo, a lei determinava que para se abrir uma escola pública era preciso que o sindicato dos professores de escolas particulares estivesse de acordo. “A duras penas, o governo Tancredo Neves conseguiu mudar e legislação em 1983”, salienta.

O resultado foi o aumento da desigualdade. “É das mais fortes que já vi no mundo”, conta. “Até o Golpe, em todos os estados, as escolas públicas eram as melhores. Podia ter escola privada tão boa, mas não melhor do que as públicas. Depois a situação mudou”, declara, dizendo também que os quadros escolares nunca mais voltaram a ter o mesmo padrão. “Hoje a escola pública se transformou em escola para pobre e de má qualidade, com exceção de instituições federais e escolas técnicas”, diz.

Por outro lado, Cunha menciona, assim como a professora Maria Helena, que o ensino superior cresceu bastante na Ditadura. “Se criou um Frankenstein educacional: ensino público superior de alta qualidade e ensino fundamental e médio de baixa qualidade. Incongruente”, avalia.

13 de mar. de 2014

Sobre Educação

Gostei muito desse trecho final do texto "A Crise do Giz", de Thomaz Wood Jr.

"Ensinar e aprender trata-se de um processo relacional que vai além dos métodos e das tecnologias. Diz essencialmente respeito a relações humanas. Não é entretenimento ou diversão. Tampouco é sofrimento. Envolve escutar, avaliar, refletir e praticar. Pode ser penoso, às vezes, mas deve sempre recompensar estudantes e professores. Pode usar novos métodos e novas tecnologias, mas depende essencialmente da construção de um palco para a interação coletiva".


10 de mar. de 2014

Doze Anos de Escravidão


Retirando a poeira deste blog, eis o ganhador do Oscar de melhor filme em 2014. Doze Anos de Escravidão. Filme elaborado a partir do livro escrito por Solomon Northuop, liberto que foi sequestrado e tornado escravo por doze anos. O filme se passa nos EUA do século XIX, mas segundo Lilia Moritz Schwarcz e Maria Helena Machado, o regime escravista de lá retratado no filme tem semelhanças com o sistema escravista do Brasil. 

As historiadoras escreveram um texto comentando o filme e as possíveis comparações entre a escravidão dos EUA e a do Brasil. Segue o link para o texto: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrissima/154391-um-pouquinho-de-brasil.shtml

8 de mar. de 2014

Dia Internacional da Mulher

Para lembrar esse dia de luta por igualdade de gêneros, deixo aqui o discurso de agradecimento de Lupita Nyong'o no evento "Black Women in Hollywood". O discurso foi retirado do blog Escreva Lola Escreva
Para quem não sabe, Lupita é atriz e ganhou o Oscar como Atriz Coadjuvante no filme também pemiado "Doze Anos de Escravidão".

Eis o discurso da moça:

Recebi uma carta de uma garota e gostaria de dividir um pequeno trecho com vocês: “Querida Lupita,” diz ela, “Acho que você é realmente sortuda por ser tão negra e ainda assim fazer esse sucesso todo em Hollywood da noite para o dia. Eu estava quase comprando o creme Dencia’s Whitenicious para clarear a minha pele quando você apareceu no mapa mundial e me salvou”.
Meu coração sangrou um pouco quando li essas palavras. Jamais poderia imaginar que meu primeiro trabalho após terminar os estudos seria tão poderoso em e por si mesmo que me lançaria como uma imagem de esperança da mesma forma que as mulheres de A Cor Púrpura o foram para mim.
Lembro de um tempo em que eu também não me sentia bonita. Eu ligava a TV e só via peles rosadas, clarinhas. Eu achava que minha pele de matiz noturnal era uma provocação e um insulto. E minha única súplica a Deus, o fazedor de milagres, era que eu pudesse acordar com a pele mais clara. Vinha a manhã e eu ficava tão excitada para ver minha nova pele que me recusava a olhar os meus pés até estar de frente ao espelho, porque eu queria ver meu rosto claro primeiro. E todos os dias eu vivia a mesma decepção de continuar tão escura quanto no dia anterior. 
Eu tentava negociar com Deus: dizia pra ele que iria parar de roubar torrões de açúcar à noite se ele me desse o que eu queria; que ouviria todas as palavras de minha mãe e nunca mais perderia minha blusa da escola se ele simplesmente me tornasse um pouco mais clara. Mas acho que Deus não se impressionava com minhas moedas de troca porque Ele jamais atendeu aos meus pedidos.
E quando eu era adolescente meu ódio por mim mesma ficou ainda pior, como vocês devem imaginar que acontece na adolescência. Minha mãe me lembrava com frequência que ela me achava linda, mas isso não me consolava: ela é minha mãe, é claro que se espera que ela me ache bonita. Foi então que Alek Wek surgiu no cenário internacional. Uma modelo celebrada, negra como a noite, estava em todas as passarelas e em cada revista e todos falavam sobre o quanto ela era linda. Até a Oprah disse que ela era linda, o que tornou isso um fato. 
Eu não podia acreditar que as pessoas estavam aceitando uma mulher que se parecia tanto comigo como bonita. Minhas características físicas sempre foram um obstáculo difícil de vencer e, de repente, Oprah estava dizendo que não, elas não eram isso. Isso era espantoso e eu não queria aceitar isso porque eu estava começando a gostar da sedução da inadequação. Mas não dava para segurar a flor que estava desabrochando dentro de mim. 
Quando vi Alek eu, inadvertidamente, vi um reflexo de mim mesma que eu não podia refutar. Agora eu tinha molas nos pés, porque eu me sentia mais visível, mais valorizada pelos distantes porteiros da beleza, mas à minha volta a preferência por peles claras ainda prevalecia. Para os observadores que eu considerava importantes, eu ainda não era bonita. E minha mãe, de novo, me dizia: “Você não pode comer a beleza. Ela não te alimenta”. E essas palavras me atormentavam e aborreciam; eu não as entendi de verdade até finalmente compreender que a beleza não era algo que eu pudesse adquirir ou consumir, era algo que eu simplesmente precisava ser.
E o que minha mãe quis dizer quando me falou que não se pode comer a beleza foi que não se deve confiar no seu visual para se manter. O que é fundamentalmente belo é a compaixão por si mesma e por aqueles à sua volta. Esse tipo de beleza incendeia o coração e encanta a alma. É o que colocou Patsey em tantas dificuldades com seu senhor, mas também o que manteve sua história viva até hoje. Lembramos-nos da beleza de seu espírito, mesmo depois que a beleza de seu corpo se desvaneceu.
Assim, eu espero que minha presença no cinema e nas revistas possa levar você, jovem garota, em uma jornada parecida. Que você sinta a validação de sua beleza externa, mas também se dê conta do profundo trabalho de ser bela por dentro. Não há tons [jogo com os significados de shade, que pode ser sombra ou tom de cor] para essa beleza.